AS MÁQUINAS E OS ACIDENTES DE TRABALHO - Acidentes do trabalho com máquinas - identificação de riscos e prevenção - Rodolfo Andrade Gouveia Vilela Engenheiro Mecânico e de Segurança do Trabalho Doutorando em Saúde Coletiva (área Saúde do Trabalhador) pela UNICAMP - SP Assessor em Segurança do Trabalho na SUCEN/SP e membro do Programa de Saúde do Trabalhador de Piracicaba/ SP.
Contrariamente ao que se imagina, a máquina não é um artefato técnico, um objeto neutro voltado a si mesmo.
A máquina é um artefato social e cultural, criado por seres humanos reais dotados de interesses e preocupações, para satisfazer determinadas necessidades.
Quando um engenheiro projeta a máquina, a pedido de um empresário, ele o faz via de regra atendendo uma demanda de maior produtividade, sem considerar os riscos gerados ou a possibilidade de acidentes.
Por outro lado, se existem sindicatos e trabalhadores organizados, a demanda de uma nova máquina, com segurança, pode ser oriunda de uma negociação conseguida entre trabalhadores e patrões, com vistas a eliminar os riscos de lesões aos trabalhadores.
As máquinas, ferramentas e aparelhos, têm papel relevante na geração dos acidentes de trabalho
Uma análise do ciclo de vida das máquinas no Brasil pode comprovar que são concebidas na fase de projeto sem uma preocupação com o ser humano que irá operar estes equipamentos, são vendidas para o mercado desprovidas de dispositivos mínimos de segurança, são colocadas em uso nestas condições.
Após a ocorrência de acidentes e mutilações, a depender do nível de organização dos trabalhadores, pode vir a ser objeto de alguma adaptação com instalação de dispositivos de segurança. A p ó s se tornar obsoleta, é novamente colocada para venda (a Rua Piratininga em São Paulo é um dos pontos especializados neste tipo de comércio).
Adquirida por uma pequena ou microempresa, com relações precárias de trabalho, novamente em operação, irá acarretar novos acidentes, estes ainda mais invisíveis que não irão constar das estatísticas oficiais.
Estudo feito nos EUApelo NIOSH – Instituto Nacional de Saúde e Segurança - revelou que ocorreram no ano de 1985 dezoito mil amputações e 843 mortes com trabalhadores que operam máquinas nos setores industrial, agrícola e da construção civil (SILVA, 1995).
Pesquisa realizada em Osasco – SP no início da década de 70 analisa 1.000 acidentes graves e conclui que as máquinas foram responsáveis por 85,5% dos acidentes, sendo que as prensas sozinhas responderam por 31,8% do total das ocorrências.
Essas máquinas são encontradas em sua maioria sem dispositivos de proteção, sendo fornecidas desta forma pelos fabricantes e revendedores, em flagrante desrespeito ao artigo 193 da CLT, que regulamenta a fabricação, venda e locação de máquinas e equipamentos (CLEMENTE, 1974).
Outro estudo sobre a questão acidentária no país conclui que a proteção insuficiente em máquinas é causa de inúmeros acidentes, bem como a utilização de máquinas antigas e obsoletas, sendo um dos fatores que torna mais vulneráveis trabalhadores fatigados, menos alertas e com reflexos mais lentos, com diminuição da acuidade visual e da coordenação motora, podendo ser atingidos com muito maior facilidade por uma máquina em funcionamento (POSSAS, 1989).
Investigação sobre os acidentados graves de trabalho, que foram encaminhados à reabilitação profissional, junto ao CRP - Centro de Reabilitação Profissional da Previdência Social, observa que o ramo metalúrgico, responde por 25% dos casos graves, predominando os acidentes com máquinas, como prensas mecânicas e o setor plástico responde por 8% dos casos, com destaque para as ‘prensas injetoras’(COHN e cols, 1985).
Investigação feita em Bauru – SP em 1990, revela que de um total de 683 acidentes estudados, as máquinas, equipamentos e aparelhos representam 14,2% dos fatores causais, enquanto quedas, choques ou perda de equilíbrio representaram 38,5%. Os autores alertam, no entanto, para a limitação das informações retiradas dos campos “objeto causador” e “descrição do acidente” das CATs (Comunicados de Acidentes do Trabalho), que por sua superficialidade e ausência de critérios técnicos, não permitem uma exploração adequada da causa dos acidentes de trabalho (- ALMEIDA&BINDER&TOLOSA, 1993).
Outro estudo com 4.895 acidentes “típicos” identificados pelo Programa de Saúde dos Trabalhadores da Zona Norte de São Paulo, classifica como graves 790 acidentes, sendo que neste conjunto, as máquinas são responsáveis por 196 casos, ou seja 24,8%, demonstrando uma importante associação entre a ocorrência de acidentes graves e o correspondente envolvimento de máquinas em sua geração.
As máquinas mais perigosas, do ponto de vista da gravidade dos acidentes gerados - com amputações e esmagamentos - são as prensas, as guilhotinas, os cilindros e calandras, as impressoras, as serras e as injetoras de plástico (SILVA, 1995).
Analisando as condições operacionais de prensas mecânicas na Zona Norte de S. Paulo, são investigadas em 1989, 290 prensas mecânicas, constatando que 52,75% das máquinas são acionadas por pedais, e 26,55% por meio de botoeiras simples. Somente 43 máquinas operam com comandos bimanuais.
A pesquisa avalia ainda os riscos junto aos pontos de operação de 74 máquinas, verificando que 37,8% destas máquinas exigem o acesso das mãos na zona de prensagem, seja para alimentação, para retirada das peças ou em ambas as situações.
Observa-se que esse acesso `as zonas de prensagem são feitos sem nenhum mecanismo de atenuação, como cortinas de luz, barreiras, sensores de proximidade, ou dispositivos de afastamento, caracterizando perigo ao trabalhador. Segundo os autores “- nenhuma máquina era dotada de dispositivo de proteção, que atenuasse o risco durante o acesso na zona de prensagem” (MAGRINI&MARTORELLO,1989).
Em 1997 levantamento feito em São Paulo, capital, constata que 70% das prensas mecânicas operam com acesso das mãos na Zona de Prensagem, apelidada de “Boca do Leão”.
Acordo tripartite com participação do setor patronal, dos trabalhadores e dos órgãos públicos é assinado neste ano visando a retirada das mãos do trabalhador das zonas de operação das máquinas, através de mecanismos de proteção como alimentação em plano inclinado, gavetas, sistema de tambor giratório e outros.
Estudo feito pelo Sindicato dos Trabalhadores Químicos e Plásticos de São Paulo no ano de 1992 constata que as máquinas injetoras de plástico respondem por metade dos casos de acidentes do setor plástico, encaminhados para reabilitação profissional junto ao Centro de Reabilitação Profissional do INSS da Capital - São Paulo. Depois de 3 anos de negociação, envolvendo os fabricantes de máquinas, os Sindicatos da Industria de Plástico, e instituições ligadas à Saúde do Tr a b a l h a d o r, foi assinada uma Convenção Coletiva de Segurança em Máquinas Injetoras do Setor Plástico do Estado de São Paulo.
A Convenção entre outros avanços estabelece prazo para as empresas instalarem dispositivos de segurança nas máquinas, garante o emprego de trabalhadores sequelados, a capacitação dos operadores de máquina e a fiscalização do acordo por parte das CIPAs e dos Sindicatos através de uma Comissão Permanente de Negociação. Novo levantamento junto ao CRP no ano de 1996 já aponta a redução para 27% da participação das injetoras no total dos casos de Reabilitação Profissional junto ao INSS.
Após 2 anos de acordo 3029 operadores de máquina injetora já haviam participado de cursos de capacitação ministrados por entidades acordadas entre as partes e 1.488 selos haviam sido expedidos para máquinas que passaram a possuir os dispositivos de segurança previstos na Convenção Coletiva (VILELA, 1998).
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