por: Mateus Ferrarezi
A problemática exposta neste artigo aborda, em especial, uma condição que infelizmente vem se alastrando principalmente na esfera judicial, quando da análise de eventual pedido de reconhecimento do adicional de insalubridade.
Não obstante existir algumas situações insalubres que são tecnicamente e/ ou financeiramente inviáveis de serem eliminadas por Equipamentos de Proteção Coletiva, deve-se considerar a possibilidade de suprimir o pagamento da remuneração, advinda da exposição, por meio de Equipamentos de Proteção Individuais.
Assim, considerando o exposto, questiona-se como as partes, em âmbito administrativo ou judicial, podem efetivamente demonstrar o fornecimento e a utilização de EPIs pelo funcionário, de modo a eliminar eventual condenação.
Para a análise da existência de prova efetiva, deve-se considerar, inicialmente, o disposto no artigo 365 do CPC/2015, que diz que todos os meios legais de prova e os moralmente legítimos, independentemente de previsão legal, são hábeis em demonstrar a veracidade dos fatos.
Ocorre que, após a introdução da alínea “h” ao item 6.6.1, na NR 6, que determina à empresa a organização de “registrar o seu fornecimento ao trabalhador, podendo ser adotados livros, fichas ou sistema eletrônico”, auditores fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego, peritos judiciais, membros do Ministério Público do Trabalho, juízes do Trabalho, entre outros, passaram a desconsiderar a efetiva entrega de EPIs, caso não houvesse a respectiva anotação, ainda que efetivamente ocorresse a entrega de protetores auriculares, prejudicando e desconsiderando o trabalho do SESMT da empresa que procurou identificar e eliminar o risco ambiental.
INTERPRETAÇÃO
Apesar do disposto na norma supracitada, a conclusão sobre a inexistência da disponibilização é incorreta, pois carece de uma visão e interpretação sistemática de todo o ordenamento pátrio que, para a presente temática, inclui, não somente as Normas Regulamentadoras, mas também o exposto na Constituição Federal, Consolidação das Leis do Trabalho e no Código de Processo Civil, bem como regras hermenêuticas e princípios correlatos.
Inicialmente, deve-se considerar que a Carta Magna, em seu artigo 5º, inciso II, ao disciplinar dos direitos e garantias fundamentais, estabelece que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, sendo que essa Lei é em sentido estrito, ou seja, não incluindo atos infralegais, como normas regulamentadoras, por exemplo.
Importante destacar ainda que os artigos 166 e 167 da CLT, que é Lei, no sentido técnico da palavra, ao regulamentarem sobre EPI, não exigem para a neutralização da insalubridade a anotação, bastando o fornecimento regular.
INFRAÇÃO
O que pode eventualmente existir é uma infração administrativa, situação que poderá, após decorrido o devido processo legal junto ao órgão competente, com respeito à ampla defesa e ao contraditório, ensejar multa administrativa, se for o caso, mas não a conclusão da existência ou não da insalubridade e/ou periculosidade.
Na verdade, em relação à demonstração da existência do fornecimento de EPIs, quer em processo judicial ou administrativo, deverá ser aceito todo o meio de prova em direito admitido, quer documental ou testemunhal.
VERDADE
Desse modo, tem-se que para a análise do fornecimento ou não de EPIs, não basta apenas a prova documental, sendo recomendável a análise do conjunto obrigatório, como o relato das testemunhas, inclusive quanto ao narrado pela perícia judicial. Cita-se a título exemplificativo uma grande empresa, cujo corpo de empregados em uma linha de produção ultrapassa centenas de funcionários, sendo o SESMT efetivo de modo a controlar os riscos ambientais.
Por lapso justificável, atrelado à correria do dia a dia, deixa de realizar todas as anotações sobre protetores auriculares entregues a determinado grupo de trabalhadores. É incrível que em posterior ação trabalhista, a empresa, não obstante ter adotado todos os meios existentes para afastar a insalubridade, fornecendo EPIs, seja condenada a pagar o adicional de remuneração? Por óbvio que não, uma vez que poderá restar demonstrado o fornecimento de equipamentos de proteção por outros meios de prova em direito admitido.
Assim, ante todo o exposto, o fornecimento de EPIs pode e deve ser evidenciado por todos os meios de prova admitidos em direito, e não somente com eventuais registros em fichas de anotação de entrega de EPIs. Somente desta maneira estará se efetivando o princípio da primazia da realidade, concretizando a busca da verdade real, quer pela utilização de outros documentos da área de medicina e segurança do trabalho e/ou por depoimentos ou relatos das testemunhas.
FONTE: FERRAREZI, M. Demanda alta. PROTEÇÃO, n. 301, p. 58-59, jan. 2017
Comments